Muito se questionou desde o início da quarentena sobre como muitas empresas resistiriam ao isolamento e a necessidade de parar efetivamente com suas atividades, até mesmo porque muitas destas não estariam classificadas como sendo atividade essencial durante a pandemia. Outros questionamentos vieram em relação a função social da empresa, imprescindibilidade de manutenção dos postos de trabalho e o temor em adquirir o COVID-19 no ambiente de trabalho, até porque após a última decisão do STF deixamos de ter o reconhecimento automático de covid-19 como doença ocupacional. E dada a decisão do STF em relação a Medida Provisória nº 927/2020 suspendendo a eficácia do art. 29 da citada MP, os empregadores têm a incumbência de reforçar as medidas de segurança e saúde de seus empregados, devendo adotar todas as medidas cabíveis e possíveis de precaução e higiene, orientando ostensivamente seus empregados quanto às ações necessárias para evitar a contaminação. Ainda em meio as medidas restritivas, imposição de isolamento por prefeitos e governadores, todo caos, medo e avanço da doença entre a população em geral, afinal ninguém está livre por enquanto, a construtora Andrade Gutierrez construiu um galpão para manter seus trabalhadores que testaram positivo para covid-19 em isolamento. Talvez por desinformação, ou talvez por medo, e, por fim, prefiro pensar que seja “efeito” do isolamento que moradores do povoado de Angico, no município de Campo Alegre de Lourdes/BA atearam fogo neste galpão. Ora, a empresa buscou de alguma maneira amenizar a situação dos trabalhadores, lhes proporcionar assistência, mantendo-os em isolamento, após 34 deles testarem positivo. Essa decisão da empresa foi motivada após um trabalhador que prestava seus serviços na obra do Linhão T-BAPI em Pilão Arcado morrer no hospital do município Buritirama. E, aqui começamos nossos questionamentos sobre a função social da empresa e repercussões que este ato realizado pelos moradores do povoado de Angico, na cidade de Campo Alegre de Lourdes não agravará a situação de saúde destes trabalhadores, pois, certamente o psicológico deles deve estar ainda mais abalado. Pois bem, se nossa Constituição e as legislações trabalhistas asseveram que é dever da empresa adotar medidas de segurança e saúde de seus trabalhadores, certamente a ideia de promover a seu próprio custo o isolamento de todos os trabalhadores com diagnostico confirmado e aqueles sob suspeita, foi razoável e demonstrou que a Andrade Gutierrez de fato preocupa-se com as consequências da pandemia. Além de ao seu modo, buscar frear a propagação da doença, até mesmo porque seria complicado assegurar assistência à distância aos trabalhadores e novas contaminações à terceiros. Até agora me pergunto quando entraremos na era da lucidez, com reflexão sobre as consequências de nossos atos, porque a dimensão que o ato de atear fogo no galpão que propiciava o isolamento social daqueles trabalhadores ainda não foi analisada. Estamos vivendo em tempos de inúmeras mudanças na legislação trabalhista trazidas pela pandemia, onde a todo instante novos debates e discussões são travadas tendo como epicentro a pandemia, a economia e as empresas. Fala-se muito em preservação do emprego e da economia, o caos, o medo e a loucura nunca estiveram tanto em evidencia como agora. Quem antes não acreditava na doença, foi infectado ou teve alguém próximo infectado, passa a defender o isolamento, enquanto números só crescem em uma velocidade que as mídias sociais e meios de comunicação não são sequer capazes de acompanhar. Voltando ao caso da construtora Andrade Gutierrez, alguns irão aqui dizer que “não fez mais que a obrigação”, outros vão falar que “ela estava querendo proteger seus cofres dos prejuízos e de futuras ações trabalhistas”, os mais otimistas “a empresa realmente se preocupa com o bem-estar dos trabalhadores”. E, as pessoas mais lúcidas concordaram, que a atitude foi um ato de desespero e um tanto inconsequente, expondo a todos. Mas, quero terminar esse texto refletindo sobre o caos, medo e relações de trabalho em tempos de pandemia, porque não falarei sobre artigos da CLT ou mesmo interpretarei mais uma vez os artigos da Constituição. Todavia, quero convidá-los a refletir sobre as consequências deste caso e se de fato houve preservação da saúde e vida, afinal aqueles trabalhadores ali isolados sofreram danos psicológicos ainda maiores. E, questiono, até onde iremos com a pandemia, o direito do trabalho e o caos?